entretanto e tão pouco...

quinta-feira, julho 21, 2005

Conchinha

Enquanto os pés sentiam a areia quente passar pelo meio dos dedos, a espinha contorcía-se involuntariamente sempre que caía aquele corpo moreno no seu campo de visão... o sal a queimar e o sol a mostrar um a um cada pêlo do seu peito. Quando os lençois estavam em guerra com o sol era aquela visão o argumento perfeito, absolutamente e deliciosamente perfeito, que ditava o destino do dia, deixando abandonados os lençois amarrotados e lá ía ela feliz para a praia... Nunca quiz nada além daquela saborosa contemplação. Não chegava nem perto de amor platónico, era só bom olhar, lamber o sal, apertar os músculos, deitar uma barriga sobre a outra ou deixar a barba dele arranhar-lhe as costas e gemer baixinho, sem que os engenheiros, que à sua frente erguiam um fabuloso castelo, se apercebessem da luxúria dos seus sonhos. Sentia que a indiferença do seu olhar estava em mutação e a cada novo encontro apareciam curiosos os pensamentos dele a espreitar pela menina dos olhos julgando-se ocultos na sombra negra em que viviam. Ela corava... dáva-lhe meio sorriso e baixava os olhos e ficava a rir-se para aquela conchinha que tinha apanhado no fundo do mar com a qual as mãos brincavam distraidamente. Perguntou-lhe se ele ainda a olhava e quando a conchinha corou ela percebeu que ele se agachava atrás de si... "deixaste cair isto... podia perder-se na areia..." e naquele preciso momento o vento enlouqueceu e um furacão levou-os na palma da mão, muito apertados um contra o outro, até uma outra praia, deserta e quente. A conchinha tinha ido de boleia bem guardada dentro da mão dela bem guardada dentro da mão dele e estava muito feliz. Sempre gostara de viajar. Sempre gostara de ser apanhada, namorada, só não gostava de ser levada para casa e esquecida... anos e anos sem ser olhada, tocada, sem o cheiro das algas e sem poder brincar com as ondas e os raios de Sol. Ele não sabia que ela guardava dentro da mão aquela conchinha mágica que tinha atirado ao mar nessa manhã depois duma longa conversa com os seus dedos...

3 Comments:

At 10:02 da tarde, Blogger Unknown said...

Muito bem escrito. É por estes textos que te digo deves escrever sempre. Pode até ser algo que te aconteceu, mas tem aquela beleza infantil do teu olhar.

 
At 10:11 da tarde, Blogger a said...

não percebes nada... não me aconteceu nada parecido! bem... claro que já lambi mt sal por essas praias fora! hihihi! beijinhos e obrigada! (lembras-te da toalha vermelha?)

 
At 9:48 da tarde, Blogger Unknown said...

Na tua imaginação eras a concha. Eu sei.

 

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